Escritas do fundo do mar

09
Dez 09


P.S. - ... e o Miguel Aragonez também!

Bilhetado por Brunorix às 13:12

02
Dez 09
O sonho acordou a meio do fim pouco depois de ter iniciado. Espreguiçou o espanto e olhou para o relógio: faltavam poucos minutos para depois. Decidiu dormir mais um pouco. Lá fora, a chuva despedia-se da noite e abraçava os primeiros raios da manhã.

Algumas portas ao lado a doença tinha começado a acabar. Fazia as malas dos últimos dias e preparava-se para mudar de corpo. Tinha cumprido a sua missão ali, fazendo o possível por deixar bem vincada a tosse, a febre e as dores de tudo e mais alguma coisa.

No andar de baixo, a partilha dava as mãos ao destino e reforçava os laços de vida com um sincero amo-te. Tinham passado a noite enroscados no sofá a beber chá de alegria e a ver filmes de futuro com um sorriso nos lábios. Para aquecer o momento tinham-se tapado com a manta da tranquilidade enquanto se divertiam a baralhar pernas.

A satisfação pessoal, que morava na rua de trás, vestia os mais pequenos projectos de vida (a esperança, o amor e a certeza) e preparava as lancheiras da escola, revendo mentalmente todos os passos da rotina diária. Era fácil esquecer alguma coisa, afinal sempre eram 3 filhos e havia muito para preparar.

Na rua tudo começava a mexer: o tem que ser já colocava as frutas e legumes, tudo fresquinho, na direcção de quem passa; o outro dia alinhava as tesouras e os pentes esperando o primeiro cabelo que se viesse guilhotinar; o mais cedinho escrevia a ementa do dia enquanto arregaçava as mangas do pequeno-almoço que tinha que se tornar grande; a vida igual abria as persianas da montra depois de ter contado todos os botões, fechos, fios e sedas; o representante acordava o representado para que atendesse os fiéis que passassem as portas da necessidade em busca das primeiras respostas do dia; o frete dos outros varria os restos da noite alheia e baldeava a consternação mútua com água renovada de esperança.

Enquanto os mortos se conformavam os vivos não. Por todo o lado, tudo seguia o caminho de sempre enquanto todos se levantavam da profundeza do descanso para dar início a mais um dia de tanto.

Do alto, uma Estrelinha (a descansar do mar) observava com alegria a dádiva do dia que nascia lá em baixo. Satisfeita, afastou as nuvens para o lado e levantou-se para ir acordar o sol. Estava na hora.



Bilhetado por Brunorix às 12:45

21
Nov 09
Voltou no presente Sábado para sua casa, uma carteira pequena (tamanho cartão de crédito) que nunca tinha fugido, nem desaparecido. Vestia a mesma camisola castanha da Camel Active e aparentava uma tranquilidade irritante que nunca perdera. Estava apenas desidratada e dorida por ter passado uma semana caída atrás de não sei quê. Não se sabendo como, não sei quem a arrumar deve ter encontrado a pobre desgraçada (ah e tal gandas porcos! - Não, não... estava MESMO escondida) e colocou-a na mesa de cabeceira (oposta). Na madrugada de hoje a família deu, finalmente, por ela ao desligar a luz em pleno azamboamento (que é qualquer coisa que dá por volta das duas da manhã). Fazia-se acompanhar pelos mesmos, o que é normal dado que nada aconteceu. A Pessoalidade Judiciária agradece toda a ajuda prestada (que foi nenhuma) e louva as atitudes incompreendidas e impensáveis que provocam estas alterações ao normal funcionamento dos gestos rotineiros, mas que têm sempre um final feliz, estúpido mas feliz.

A família aproveita para agradecer, sobretudo o facto de não ter que exasperar em lojas do cidadão e afins. Os cartões do banco até estavam sujos na zona da banda magnética e por isso não vem grande mal ao mundo pelo facto de terem sido substituídos.



(Segundo fontes próximas, a família pondera a utilização de novas tecnologias que previnam futuros embaraços).
Bilhetado por Brunorix às 11:44

20
Nov 09

- Oh Chefe! Desculpe lá.
- ??
- Isso dá mesmo 200?
- Bem… até dá. Mas o que tem mais é força. Até porque pesa muito.
- Quanto?
- Uns 250 kg.
- Bem, mas é um ganda motão! Já viste meu?!
- Pois é… se eu tivesse uma dessas todas elas se sentavam!
- Podes crer! Ena pá… o meu sonho era ter um motão assim. Obrigadinho oh Chefe, boa viagem.
- Nada, até logo.




Sentei-me na minha pesudo-burguesia-envergonhada e arranquei consternado perante o quadro: o sonhador estava de muletas e mal se aguentava de pé, o conquistador não se aguentava definitivamente de pé porque já estava sentado no chão. Ambos rasgados e muito sujos, completamente desdentados pelo vício, o olhar vazio pela dose matinal já tomada, mas com um brilhozinho lá no fundo a admirar o meu sonho, que afinal também era o deles…

Tive vontade de desmontar, dar-lhes a chave e vir embora a pé. Mas isso não é a realidade e não havia como fazê-lo. Apenas a consciência de outras vidas me remoeu o pensamento. Egoistamente despejo o meu incómodo para aqui e sigo a viagem de mais um dia esquecendo vivências que afinal não esqueço. Uma neblina de pena abate-se na minha manhã… não gosto de o sentir mas senti.

Sonhador: não te conheço, mas vejo-te todos os dias. Se conseguires dobrar a perna levo-te a dar uma volta no nosso sonho.


P.S. - Foto by tirada no dia em que o meu sonho começou.

Bilhetado por Brunorix às 10:21

18
Nov 09
Desapareceu no passado Domingo 15 de Novembro de sua casa, uma carteira pequena (tamanho cartão de crédito). Vestia uma camisola castanha da Camel Active e aparentava sinais de desorientação e transtorno (só assim se justifica que tenha fugido). Fazia-se acompanhar por um cartão do cidadão, por uma carta de condução, por um cartão multibanco e um visa (devidamente anulados nesta fase, pese embora os ridículos saldos à disposição - é nestas alturas que compensa ser um miserável), alguns cartões profissionais pessoais (dispensáveis) e 35€ em notas (que até se dão por mortos de bom grado). A Pessoalidade Judiciária agradece qualquer informação que ajude a encontrar o seu paradeiro.

Se a virem por aí, digam-lhe que volte para casa porque a família está muito preocupada e sem tempo para lojas do cidadão e afins.



(Na foto era mais nova e não tinha a mesma roupa. Também nunca se fez acompanhar por um American Express, mas dá para ver a carteironomia)

Bilhetado por Brunorix às 16:21

02
Nov 09
Certo é que o domínio de uma arte, de um objecto, de um instrumento é sempre algo de sublime. Então quando se exerce esse domínio com a mesma naturalidade com que se respira, tudo se torna eterno e único. As notas desfilaram nos nossos interiores com a suavidade transmitida por um ancião musical, um mestre de melodias mais ou menos conhecidas, mas todas com um toque de magia.

Mais que o intérprete, louvo o criador. O criador de sonoridades que acompanharam grande parte da nossa existência sem muito complemento visual, mas que simplesmente sempre estiveram lá. Juntar, desta vez, a imagem ao som e ainda por cima a solo, teve o condão de nos fazer voar pelos sons rendidos à arte. E que arte. António Pinho Vargas A Solo, encheu um palco inteiro sem precisar de mais ninguém. Imperdível. É nestes pequenos pormaiores da vida que agradeço as oportunidades que se desfilam nas nossas existências. Obrigado pela lembrança e pela surpresa!

Embora as vivências não se transmitam com a mesma emoção com que se recebem, aqui fica uma das minhas favoritas que me acompanha o imaginário, felizmente real, desde 1987. Sem mais palavras que o momento é mais de ouvir do que de ler…


Bilhetado por Brunorix às 13:22

31
Out 09

Romanov nasceu na Roménia e era o nono de nove irmãos, não se sabe bem de onde lhe veio o nome mas era Vampiro de formação. Vivia em Portugal há cinco anos, onde nunca exercera, e trabalhava nas obras. Sempre ganhava mais cá a ser explorado no mundo do betão armado, em parvo, que na Roménia a explorar pescoços cinzentos.

Soube por um colega trolha, também Romeno mas não Vampiro (parece que na Roménia tinha sido ministro das Obras Públicas), que ia haver o lançamento de uma colectânea de contos de Vampiros na Cantina Lx pelo entardecer da noite de quinta-feira passada. As saudades impeliram-no na direcção da curiosidade. Assim foi (e foi mesmo que eu vi-o lá).

Mal chegado, brindaram-no com uma magnífico cocktail de beterraba picante (que já não bebia desde os seus tempos de Vampiro caloiro na faculdade). Comprou logo um exemplar da colectânea que começou a devorar enquanto esperava. Começada a cerimónia, várias almas penadas se aprontaram a sentar. Uns atrás da mesa, outros à frente. Romanov depressa percebeu que os que se sentaram do lado de trás eram os autores, pálidos de tanto se terem esvaiado em sangue literário. Iniciada a contenda, o mestre de cerimónias (também branco mas por doença e que lhe fazia lembrar o seu antigo professor de Mordidelas de Escrita Sangrenta II) esgrimia apresentações e perguntas enquanto os autores se deliciavam com dentadas de argumentação em pescoços de leitores e fãs.

Quando finalmente se acendeu o final, teve ainda tempo de pedir autógrafos e trocar impressões de Vampiro experimentado. Orgulhosamente chegou à conclusão que a sua experiência vampírica e empírica, lhe davam o destaque silencioso de quem já provara verdadeiramente o sangue. No entanto, o alho da crítica literária aguçava a sua curiosidade e correu (voou?) para casa onde só parou de ler na manhã do dia seguinte, ou seja ontem.

Arrasado mas satisfeito, arrastou-se cheio de sono para o seu destino de cimento, já com um atraso de uma hora. À chegada foi brindado com um sonoro, mal cheiroso e estridente (até porque só se viam três dentes):

- Olha lá oh Romeno! Não te pago para chegares a esta hora!

Foi o último som que saiu daquela garganta. Mesmo sem licença para exercer em Portugal não resistiu à dentadinha da saudade.




P.S. – Parabéns para a Susana, que de entre todos deu a dentada mais apetecida... a de estreia!


20
Out 09

Ainda o sol não sabia que era dia e já a necessidade se levantava na direcção de uma feira que não era Terça por ser Sábado, na expectativa de uma Ladra que vendia o que era seu. O pensamento positivo de que o que tem que ser tem muita força, ajudou a abraçar a saída nocturna com a tralha pelas costas.

A confusão era geral e fazia-se acompanhar por um frio fininho que insistia em dormir do lado de dentro da única roupa que não era para vender: a do corpo. Por todo o lado se instalavam pertences em esperanças de 2 por 2 (metros) com licença! Passe, passe que eu também a paguei e não vejo cá o nome de ninguém. Por acaso hoje pode ficar aí que a senhora não vem. Ainda bem. Siga a venda!

As primeiras conquistas fizeram-se ainda sem luz e logo no desembrulhar da coisa. A mercadoria ainda nem assentara no expositor e já alguém as cobiçava, e levava. Sempre ao preço certo. Nem mais nem menos. É escolher.

JBJ Lda., fizeram da parceria a alegria da troca quase directa, como o sono, e não perderam o sorriso na disputa. Começar por cima, rir de baixo e chegar a acordo lá pelo meio. Visitas, fizeram-se sentir em doce recordação. Obrigadão!

Tire lá qualquer coisa que ainda tenho que fazer a bainha. Tadinha. Tome lá o desconto, por causa do ponto, mas não leva saco. Se levar cinco só paga quatro. Ai que é tudo tão pequenino, quem me dera caber aí. Não há problema que o tecido estica. Olhe que isto é verdadeiro. Epá calma que eu vi primeiro.

Um ano e meio volvido e com a mesma música 8 ali do lado, a inclinação da aventura relembra depois de 11 horas a satisfação das dores nas costas. Gostas?! A causa é boa e assim tudo se aproveita, tá a conta feita.




P.S. - É de salientar a avidez com os clientes escolhiam a mercadora...
Bilhetado por Brunorix às 12:44

02
Out 09
Veio de longe com uma mala cheia de boas intenções na mão. Trazia no olhar a tranquilidade própria, misturada com a estranheza da vida polvilhada por um espanto quase inocente. As palavras saíam em acordes de melodia familiar embaladas por doses certas de preocupação.

Demorou trinta e cinco anos a chegar, mas não tardou a ocasião. Também não se fez ladrão, nem criou confusão. Apenas veio. Sincero, sem merdas. Franco de amizade, soube a pouco o tempo e a partilha.

A geografia da vida não permitiu outros tantos, mas criou linhas. Linhas de respeito e admiração. Linhas de orgulho e até algumas de inveja. O comboio do regresso levou a mala menos cheia de confusões, mas carregada de momentos. Foram intensos. Na estação ficou a saudade. No mínimo que se repita.

Obrigado por teres vindo… abraço!


Bilhetado por Brunorix às 10:06

26
Ago 09
Um escritor e a sua dor partilhavam meia dentada de um texto inteiro. Mordia o escritor, a questão, enquanto a dor mastigava no porquê. Porquê? Porque antes de engolir convém trincar.

Um sacristão e a sua religião penduravam-se em sinos de descoberta. Puxava o sacristão, soava a badalos dados a religião, e por toda a região. Levantavam-se os crentes e, entre dentes, acertavam horas de fé. Sempre de pé.

Um médico e o seu nariz ortopédico liam jornais de embaixada. Que maçada! Passavam páginas de surpresa em preta tinta de contraste branco. É verdade, esta noite estou de branco. E banco mais banco não há.

Um jornalista e a sua crista entrevistavam questões. Aldrabões. Telefonavam para gabinetes anónimos e deixavam correr a água das fontes. Compraram um acordo ortográfico e fizeram-se à estrada da notícia.

Um trabalhador e o seu fedor choravam-se em saudades de areia. Que tareia. Acabadas as ondas do descanso estenderam a toalha da responsabilidade. A bandeira verde da realidade permitia mergulhar nos problemas. Sem dilemas, é só trabalho!

Cada um faz o que pode. Bom regresso.


Bilhetado por Brunorix às 18:33

12
Ago 09

Depois de um Porto, Santo pelo sentimento que deu à costa e de mais uns dias com água no horizonte circundante o regresso fez-se num novo estado, civil por definição.

As baterias carregam-se, a vontade confirma-se (sem assinaturas, viva o simplex!), a escrita aguça-se, os segredos contam-se. O tempo encurta a distância e bilhetar por aqui é difícil de concretizar. Fica a passagem para matar a saudade.

Trabalho, hoje, foi engano. Sigam as férias!


Bilhetado por Brunorix às 17:41

25
Jul 09
Ainda mais que da outra


Bilhetado por Brunorix às 00:26

21
Jul 09
São preciosidades do destino que devemos conservar, cuidar e de preferência usar em proveito próprio, e se possível dos outros também. Nem todos são abençoados com estes desígnios do Senhor, mas o que são deviam ser OBRIGADOS a usá-los da melhor maneira possível.



Felizmente, é o que faz este “abençoado” que dá pelo nome de Luís Franco Bastos e que usa este dom de uma maneira arrepiante. Independentemente dos textos lidos o timbre das imitações é tão igual nalguns casos que parece que as pessoas estão ali na nossa frente a sair pela garganta dele.

Absolutamente a não perder. Aqui fica um gostinho do que se pode rir, sendo que ao vivo arrepia mais.




Bilhetado por Brunorix às 19:02

17
Jul 09
Saía pela janela da Mãe
Entrava pela porta do Pai

Saltava da algibeira do Pai
Escondia-se na mala da Mãe

Deixava a obrigação da Mãe
Escolhia a imposição do Pai

Despia o verde do Pai
Vestia o azul da Mãe

Estudava a facilidade na Mãe
Decorava uma fraqueza no Pai

Fugia da vida do Pai
Fugia da vida da Mãe

Era um Pim-Pais-Pum



Procurava o aconchego da Mãe
Chorava no ombro do Pai

Abraçava a distância do Pai
Escrevia a imagem da Mãe

Absorvia as entrelinhas da Mãe
Decorava os cabeçalhos do Pai

Os pais fugiam-lhe da vida
A vida fugia-lhe dos pais

Era um Pim-Pais-Pum



Para F e M, os miúdos do momento.
Bilhetado por Brunorix às 17:36

10
Jul 09
Apanhado na curva da surpresa, respondi ao solicitado com a ansiedade do resultado. Depois de uma contribuição imaginativa, seguiu-se um testemunho. Foi sentido, foi verdadeiro e foi simples como todas as coisas boas. Gostei do resultado e ele pode ser lido aqui, ou aqui ou… Aqui!

Como a modéstia é uma característica de quem cria (eu pelo menos queria), pode também ser lida AQUI. Os escolhidos, são os afortunados do acaso e não fazem caso que outros sejam tolhidos. Obrigado pela escolha e prometo continuar modesto!




P.S. – RL: vista como liberdade de escrita na perspectiva de concordância com a imagem, claro!

Bilhetado por Brunorix às 17:22

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