Enquadramento
Escrever a partir de uma série de movimentos feitos por uma actriz. Não há falas, só gestos e expressões. Em duas partes, a primeira descreve apenas os movimentos factualmente enquanto se observa; a segunda é o exercício propriamente dito. Uso da criatividade (d)escritiva.
Acção
Primeira parte (2 minutos) – Entrar. Cara de espanto. Pegar num objecto. Acariciá-lo. Apalpar as paredes com ar de saudade. Pegar num pano. Emoção nostálgica. Olhar a janela. Abri-la. Sensação familiar. Sentar e pegar num livro. Cheirá-lo. Recostar e sorrir.
Segunda parte (15 minutos) – Abriu a porta para o que já sabia que não sabia que ia encontrar. Esperava algo, mas não sabia o quê. Estaria tudo na mesma?! Entrou…
A primeira coisa a cair foi o queixo, seguiu-se logo a surpresa e a admiração. Só o conforto do alívio se manteve de pé. Deu dois passos no interior da certeza e pegou na primeira recordação que os seus olhos viram. Abraçou-a como a um filho. Largou-a.
Acariciou as paredes e esfregou o contentamento na branca frescura da tranquilidade. Afinal, ainda se lembrava do cheiro da infância.
Pegou num pano que bordara na escola e sorriu na nostalgia da falta de jeito. Nunca se dera com trabalhos manuais. Correu para a janela e abriu-a de emoção. A paisagem que se via era nova mas completamente familiar. Tantos anos longe.
A secretária, apesar do pó do abandono, estava impecavelmente limpa. Tudo no mesmo sítio como se o tempo tivesse sido desligado. Sentou-se na cadeira de outrora e recuou sensações. Rebobinou a vida, e agarrou no último livro que tinha lido naquela secretária. Abriu-o. Cheirou-lhe à história que ainda sabia de cor.
Que bom voltar à criança intemporal que sempre fora até ter que deixar de ser, quando os minutos passavam devagar e as horas se distraíam em pensamentos. Foram bons momentos.
Posou o livro, recostou-se no descanso e sorriu até hoje.