Escritas do fundo do mar

31
Out 08
(…) “- Não se arme em pudico, que estamos entre cavalheiros e toda a gente sabe que os homens são o elo perdido entre o pirata e o porco. Gosta dela ou não?” (…)


Carlos Ruiz Zafón, in O Jogo do Anjo



Bilhetado por Brunorix às 16:07

Perdoem-me os mais sensíveis e literatos seguidores, se também gosto de incautos momentos brejeiros. Mas que dá para rir, dá. Esta saga é sobejamente conhecida e merece ser seguida. Nada de preconceitos, nem pudores. Afinal é sexta-feira e rir é a melhor maneira!



Este é o primeiro episódio de 11 e daqui para a frente é sempre a descer de nível, mas a subir de interesse! O resto da série fica aqui no local original, onde se podem encontrar mais sagas. Sempre com bolinha no canto… mas afinal, não é essa a motivação?!
Bilhetado por Brunorix às 15:56

É repetido, bem sei. Mas não posso deixar de reforçar a alegria do que é bom, do que nos toca, (e se foi tocado!) e do que se descobre e redescobre! A magia é a mesma, a beleza e a nostalgia também, a diferença, aliás, a grande diferença é que agora se pode ouvir!




Aqui fica, com a devida vénia aos autores do blogamus. Nunca me cansarei de divulgar este disco, de divulgar o que é bom e que é português, de divulgar o que tem a marca de uma época marcante (em que ainda nem havia telemóveis! Estou mesmo a ficar dinossauro) e de divulgar o prazer perdido em tardes de nostalgia e crescimento. O meu ser musical cresceu ao som deste jardim.

Em sexta-feira de recordações, a minha homenagem sentida, e reforçada, a um disco eternamente maravilhoso!


P.S. - É pena serem só 4...
Bilhetado por Brunorix às 13:04

30
Out 08
Se dúvidas houvesse, certezas seriam. A não ser que um bando de Saramagó-fanáticos ou um grupo de seres Revertianos, invada este blog violentamente nos 3 dias que faltam, vamos mesmo ler o Hotel Memória do João Tordo. Por isso, penso ser seguro dizer que os interessados em participar podem diligenciar a obtenção da obra em questão, não esquecendo de respeitar os autores! Vejam lá a dignidade das aquisições, nada de cópias, empréstimos ou outros actos ilícitos… :)

Domingo será dado o tiro de partida, com a marcação das datas e a ordem de trabalhos. Até lá, e para quem quiser conhecer o autor, aqui fica a sugestão de uma sexta-feira diferente.



Bilhetado por Brunorix às 16:02

Exercício de aquecimento - de uma lista dada de palavras estranhas, inventadas ou não, escolher uma e trabalhá-la nos seguintes aspectos:

1 - Definir
2 - Provar a palavra
3 - Comparar (usando os sentidos)


Rezou assim:

1 - MACHONARIA, é uma sociedade secreta de Macho Latinos que se revela, sobretudo, nos subúrbios da noite portuguesa. Teve o seu início no nascer do séc. XX, devido a um erro literário, pois a sua transcrição fonética foi feita por alguém que trocava o som “ÇO” por “CHO”. Presume-se, por isso, que estivesse a falar da Maçonaria. No entanto, a palavra ficou, a sociedade também e podem ser encontrados muitos dos seus membros por aí. Caracterizam-se pela famosa camisa aberta (com pelos do peito à mostra, ou não, conforme o grau de masculinidade com que foram divinamente abençoados), fio de ouro e unha grande no dedo mindinho, a não menos famosa unhaca! Alguns completam ainda com o belo do palito!




2 – A palavra MACHONARIA deve o seu sabor ao verdadeiro homem português. O legítimo, o original, o bem chunga! O seu travo apimentado de baixo nível, contrasta com o doce paladar de genuidade e ingenuidade, polvilhada com um pouco de piroseira. Depois de marinar nalguns anos de cultura suburbana, pode servir-se a gosto (mau sobretudo).

3 – Devido às suas características únicas, MACHONARIA é dificilmente comparável, sendo no entanto a tentativa mais aproximada algures entre o cheiro a rebuçado barato (o mais enjoativo possível) e o toque suave da napa que imita pele, passível de adquirir em qualquer feira do país. A sua palidez intelectual divide-se pela literacia do jornal desportivo (só títulos e fotos) e a primeira página da Nova Gente (a da mulher nua) aquando da espera no consultório ou barbeiro.



P.S. – Exercício de 5 minutos (original), mais 10 minutos na revisão (sobretudo ponto 2 e 3).

P.S.2 – Obrigado ao modelo pela ilustração fotográfica do espécimen (espécie men – é um tipo de homem Machon)


Bilhetado por Brunorix às 13:14

29
Out 08
(…) “Não sei onde foi a miúda buscar aquele temperamento. Acho que é de tanto ler. E olhe que as freiras bem nos avisaram. Já o meu pai, que Deus tenha, dizia: no dia em que for permitido às mulheres ler e escrever, o mundo será ingovernável.” (…)


Carlos Ruiz Zafón, in O Jogo do Anjo





P.S. – O livro é bom que se farta, até chateia! Emitirei bilhete mais tarde…
Bilhetado por Brunorix às 16:55

Para que póssamos perceber a mensagem
Temos que nos imbuir do espírito do coiso e tal
Se para uns é derivado ao facto da imagem
Para outros é resposta a verdade e agem
Como se tênhamos de grunhir e falar mal

Dão-se pontapés em bolas e gramática
Apagam-se fogos e acentos do bardo
A Autoridade nisso também tem prática
Em prevaricar uma língua apátrida
Em nome do que deve de ser falado

E se tanto erro até me arrepia
Que dizer de um qualquer percebestes
Pois aquele que aldraba não cria
Diz palavrão que ninguém entendia
Fala desviado em erros como estes

Maldita língua mal dita e falada
Que de escrita também sofre tanto
Mal sabida e manteram mal dada
Porque não é por todos amada
Mas é por ela este meu pranto






28
Out 08
1ª Parte

Descrição de Gervásio W. segundo estes pontos :
• Idade avançada
• Tique/hábito frequente
• Peça vestuário/ adereço que o caracteriza
• Objecto em casa


Já entradote na vida, Gervásio Wellington III, tinha o estranho hábito de só caminhar pelo lado esquerdo das ruas. Segundo consta, já o seu pai, Gervásio Wellington II, o fazia.

Filho de finas castas, Gervásio Wellington III, parecia não se incomodar com os comentários que no bairro faziam a seu respeito. Uns pelo facto de só caminhar pelo lado esquerdo, outros pelo seu ar costumeiro sempre com o mesmo fraque cinzento, de tão preto que já não era, outros ainda, pelos sons estranhos que se diziam vir da sua casa.

Mas, a verdade verdadinha, é que Gervásio Wellington III do pouco alto dos seus talvez 70 anos, não parecia ter mais de metro e meio, nunca perdia a sua pose e orgulho em cada passada, sempre pelo lado esquerdo, claro!

Quando me mudei para o andar por baixo do seu, passei a ser o rei da escola. Todos me queriam visitar, só para poderem saber mais qualquer coisa sobre Gervásio Wellington III e os estranhos sons que se ouviam todas as tardes.

Com o passar dos anos fui-me habituando aos costumes e poses do meu vizinho. E, foi no verão de 1965 que me aproximei da verdade ao ponto de ficar a saber a origem do mistério sonoro. Não passava de uma grafonola que tocava um disco gasto e já sem qualquer música, mas aos porquês já lá vamos. Primeiro o como.






2ª Parte

Descrição feita pela irmã W. segundo os mesmos pontos:

Estou cansada! Estou farta! Estou desgastada… uma vida inteira na sombra dos Wellington masculinos! Primeiro, segundo, terceiro…

Felizmente que o meu irmão não teve filhos e também não vai ser a minha filha a continuar esta palhaçada! Quando o Gervásio morrer, acabaram-se os estúpidos fraques e a ideia absurda de que um Wellington só caminha pelo lado esquerdo! Felizmente que eu nasci para caminhar livremente pelas ruas.

Só me custa que o Gervásio tenha enlouquecido daquela maneira… até parece mais velho do que é, sempre a tocar a maldita grafonola todas as tardes, com o mesmo disco que de tão gasto já nem se ouve há mais de 20 anos! Tudo porque no dia em que a mulher dele saiu de casa, era aquele disco que tocava.

No meio do meu ódio, não deixo de ter pena do meu irmão que acabou por ser uma vítima desta loucura de “linhagem Wellington”, como lhe chamava o meu pai, mas também não posso deixar de compreender a Adelaide… quem é que aguenta viver com um Wellington, ainda por cima III?

Eu sei que somos todo o resultado das somas e subtracções da vida, mas há contas muito desiguais e restos que não batem certo… só porque não nasci homem! Que culpa tenho eu?!

É estranho… não me lembro de alguma vez ouvir o meu pai a dizer o meu nome todo. Era só Gertrudes para aqui, Gertrudes para ali, nunca o Wellington se juntou! Parecia que eu não tinha direito ao ferro quente em forma de W, assim como uma vaca tresmalhada no meio daqueles touros todos.





3ª Parte

Descrição de outra pessoa que o conheça bem, segundo os mesmos pontos:

Comecei a investigar este estranho caso na noite de passagem de ano. Findava o 72.

Estudo as passadas deste homem há mais de 6 meses. Sei tudo sobre ele. Estudei a sua vida intensivamente. Exaustivamente. De uma maneira que já me farta e enjoa!

O que interessa por agora são os factos! Gervásio Wellington III, era um homem de 61 anos que descendia de uma família ilustre, mas de estranhos hábitos. Segundo a sua irmã, não ficava bem a um Wellington caminhar na rua sem ser pelo lado esquerdo. O fraque era vestuário de consumo único e obrigatório! As rotinas faziam destes homens os ilustres portadores do estandarte familiar: os mesmos horários, a mesma roupa, o café sempre no mesmo café sempre à mesma hora, o jornal comprado no mesmo sítio… um imenso círculo fechado e rotineiro.

Mas o facto mais importante de todos, é que Gervásio Wellington III, apareceu morto na noite de passagem ano a ainda não fazemos ideia quem o matou, nem como, nem porquê.

Não havendo mais ninguém na sua vida, e com todo aquele ódio exacerbado, penso logo na irmã, mas…





4ª Parte

Continuação da 1ª parte, descrevendo a casa de Gervásio W.:


Tudo aconteceu por um simples acaso, como muitas das notas que pautam a nossa vida.

Num abafado dia de Julho, entrei ofegante no prédio depois de uma quentíssima caminhada vindo da escola. Sentado no primeiro lance de escadas estava o senhor Gervásio com a pele da cor gasta e cinzenta do seu fraque e encharcado em suor.

A medo aproximei-me e mal consegui perceber as parcas palavras que me dirigiu, mas que pareciam suplicar que o ajudasse a entrar em casa. A muito custo, lá conseguimos chegar ao 2º andar. Uma vez entrados, pediu-me que o ajudasse a sentar numa poltrona de um cabedal muito gasto, nitidamente “mono-rabo”, que se encontrava numa sala pesadamente antiga, entre a janela e uma mesa onde estava uma grafonola.

Depois de se encaixar naquele assento, perfeitamente demarcado em redor do seu corpo, pediu-me que lhe trouxesse um copo de água.

A cozinha ficava no fundo de um enorme corredor, que tinha várias portas dos dois lados. Caminhei por aquela estreita passagem, sentindo um ranger castanho a cada passo que dava e fui observando as fotografias daqueles homens diferentes, mas que pareciam todos iguais… vestiam da mesma maneira e tinham todos a mesma pose de superioridade altiva, numa delas reconheci o senhor Gervásio.

Umas das portas estava aberta e não resisti a espreitar para uma sala enorme cujas paredes se encontravam cheias de livros. Uma secretária e uma cadeira no centro, compunham o ramalhete mobiliário daquela divisão. Senti um peso cultural imenso naquele ambiente e invejei a possibilidade de poder ler todos aqueles milhares de livros.

Apressei-me a ir buscar a água e voltei para junto do meu vizinho, que já devia estar seco de tanto esperar. Com o seu adormecer agradecido, decidi explorar melhor aquela casa tão misteriosa e fascinante.

Ao lado da sala havia uma porta que estava fechada à chave. Na porta seguinte ficava o quarto do Sr. Gervásio onde sobressaía um magnifico toucador cheio de objectos que nitidamente não lhe pertenciam e que se notava não serem mexidos há muito tempo, tal era o pó que os cobria. Transpirava dor naquele quarto, envergonhado saí…

Não tive coragem de abrir mais nenhuma porta, mas senti que a principal já estava aberta, pois a partir desse dia passei a frequentar amiúde a casa do meu vizinho Gervásio Wellington III.

A cada visita fiquei a perceber o que leva um homem a viver eternamente um amor acabado e a colocar com uma esperança mórbida o mesmo velho e desgastado disco, na mesma velha e desgastada grafonola. Os estranhos sons que se ouviam pelo bairro, não eram mais que o choro do coração daquele homem!




Exercício de utilização de diferentes narradores. 7 minutos cada parte (revisto).
Bilhetado por Brunorix às 11:33

27
Out 08
Mais 200 Km merecidos, para uma deslocação de extremos: visitar a mais nova e o mais velho, pela melhor razão e pela pior, pela saudade e pelo dever. Enquanto de um extremo se assustam receios e doenças, no outro celebra-se a dádiva da vida num esplendoroso crescimento.

Resplandecente o orgulho que envolve a certeza numa apadrinhada emoção. Plantam-se emoções, colhem-se saudades e desejos. Desdobra-se o tempo no acompanhamento possível, numa estratégia de vivência distante que sempre parece ufanar cada regresso sentido. Afilhada razão de viver, que me faz sentir saudoso na partida. Que lindo é o teu crescer!




Opostamente, e apesar da ternura de uma muita idade, o medo devolve à realidade a crueldade do destino de todos nós. São extremos de um ciclo: nascer e morrer! Tenta-se esquecer um, recorda-se facilmente o outro, numa questa que se quer longínqua. Nunca queremos acreditar que ela existe e que está já ali. Mas está. Por isso, e até lá, vamos vivendo e esperançando!



P.S. - Só mais um bocadinho. Egoisticamente, não estou preparado para que te vás já embora!

P.S.2 - Fiquei ainda a saber, que para aqueles lados há um porco que não concorda com o aeroporto em Alcochete. Senão, atente-se nesta canção reivindicada a plenos pulmões de 3 anos: O poquinho foi à ota e comeu uma buota!
Bilhetado por Brunorix às 23:09

Merecidos 150 km, os que me levaram à cerimónia de entrega do Prémio Nacional de Poesia Actor Mário Viegas. Poesia (muito bem) declamada, recordações de um grande senhor e orgulho na amizade, preencheram a espaços poéticos uma noite que se quis literária de viver e premiada de orgulhar.

A cerimónia teve lugar num alto lugar de memória, o Fórum Mário Viegas em Santarém, e contou com a presença (para além da minha) do Exmo. Sr. Presidente da câmara Dr. Francisco Moita Flores e outros ilustres convidados de igual craveira.




Da escrita do nosso amigo Fernando Cabrita (grande mergulhador!) já eu sabia da existência, agora da beleza de suas palavras e ditas com tal eloquência, é que me surpreendeu de tais lavras os dotes e a sapiência!

Muitos parabéns por este prémio, mais que merecido, e muito obrigado por uma noite inesquecivelmente poética!




P.S. – Uma nota ao senhor presidente da câmara: sair a meio de uma cerimónia para atender o telemóvel (que ainda berrou por algum tempo) é que não me parece bem… e eu que até gosto muito dos seus livros! Perdoei-o mais tarde, aquando das suas parcas mas muito sentidas palavras. Enfim… no melhor pano cai a nódoa.

Bilhetado por Brunorix às 13:39

24
Out 08
A música alta não permitia muitas conversas. A agradável tontura de algumas bebidas, tornava afoita a troca de olhares, permitindo alguns sorrisos atrevidos. Na verdade, eram as duas únicas pessoas da festa que não estavam acompanhadas. O jogo de sedução parecia criar uma redoma em torno dos dois, embora estivessem em cantos opostos da sala.

Várias bebidas, olhares e sorrisos mais tarde a distância encurtou para a proximidade de um cheiro. As palavras não eram necessárias naquela partilha. Todos os outros sentidos estavam em alerta máximo e a temperatura aumentava a cada minuto de sedução.

O calor das vontades tornava rosadas as faces da vergonha, que era cada vez menos, e um aquiescer de olhar foi suficiente para aceitar o convite de uma mão estendida. O desejo e a luxúria caminharam de mãos dadas na busca de um quarto vazio. Do lado de lá da primeira porta, dois corpos já nus numa dança de suor indicavam uma já ocupação.

Alguns sorrisos de cumplicidade mais à frente, encontraram uma porta entreaberta para o desejo. Na escuridão adivinhava-se uma divisão espartana, mas perfeita para os intentos lascivos que se adivinhavam. Porta trancada e duas bocas que se encontram no escuro, sem conseguir aguentar mais a distância.

O bailado de duas línguas ávidas, foi aumentando a tensão e desapertando incómodos e barreiras. Encostada à porta, sentiu de repente um ajoelhar que lhe tirava as cuecas com os dentes e lhe levantava o vestido, desnudando a pele que era beijada ao ritmo do desejo que se tornava cada vez mais incontrolável. Uma língua percorria todos os seus contornos, dando voltas de falso pudor antes de se concentrar no seu interior húmido e ardente. Ao primeiro contacto, sentiu um arrepio orgásmico que deixou a sua cabeça ainda mais à roda. Sentia vontade na retribuição.




Trocados os joelhos que estavam no chão, desapertou-lhe os botões das calças um a um deixando antever todo aquele prazer inchado. Uns boxers mais tarde e engolia com volúpia uma erecção descomunal de ansiedade há muito esperada. Abocanhar, lamber e chupar fizeram parte da dança que se seguiu em ritmos molhados.

Ansiosamente retiradas as poucas roupas que ainda sobravam, encontraram-se sobre um chão frio de tanto calor que suportava, numa ávida luta carnal de incontrolável desejo descoberto, com um tom de familiaridade sempre presente. Uma cavalgada incessante marcou o tempo seguinte, dominado pelas rédeas ardentes da paixão. Uma penetração de intensa profundidade fundia suores, sabores e cheiros. Agora de cócoras, agora de gatas, mas sempre numa oferta submissa, penetrada por doce partilha de intimidade. Aqueles corpos amavam-se no momento, confundindo sentimento e desejo com expectativa e certeza.

Vários orgasmos mais tarde, entregaram-se ao descanso merecido depois da intensa batalha de tesão sentido e abusado. A verdade escondida pela loucura lasciva, fazia sorrir de nudez dois corpos que contemplavam o tecto ainda ofegantes:

- Foi uma óptima ideia termos vindo a esta festa!
- Pois foi... anda, veste-te depressa que ainda temos que ir buscar os miúdos a casa da minha irmã!

Bilhetado por Brunorix às 20:08

O cheiro a destino pairava no ar. O vermelho vivo de felicidade de Lupe, contrastava com o verde pálido de aceitação de Pepe. O fiel da balança tombava para o lado da inevitabilidade e o contraste das emoções ardia a olhos sentidos.

Tomei o meu lugar na longa fila de suor, esperando a minha vez para desejar felicidades aos noivos. A temperatura num México sempre escaldante, rebentava com todas as escalas de aceitação para um Europeu como eu, naquela tarde de actos consumados. Chegada a minha vez, felicitei os nubentes e entre abraços e beijos congratulei-me por ter reparado qual era o que usava vestido, pois a julgar pelos dois bigodes, que igualmente me picaram, podia ter ficado baralhado.




O aliviar de um casaco agradavelmente colocado nas costas da cadeira, permitiu que a minha camisa finalmente descolasse das costas. Emocionado pelos 40 graus mais suaves daquele dia, apresentei-me aos restantes convivas da minha mesa, explicando que estava ali para fazer uma reportagem sobre o concurso mundial de noivas de Santo António, na tentativa de justificar o que fazia alguém como eu no meio de alguém como eles. Acho que não perceberam mas aceitaram-me à mesma, permitindo que saboreasse todas aquelas iguarias maravilhosas que em nada se pareciam com os sabores que conhecia da Cantina Mariachi do Colombo. E das Amoreiras. E… do Gaiashopping. E doutros shoppings que tais.

Na terceira rodada de tequila, lembro-me vagamente de ter esborrachado alguns feijões com a testa aquando da queda da minha cabeça para cima da mesa. Duas tentativas mais tarde, para a levantar, sorri parvamente para os restantes dizendo que sardinhas e vinho tinto é que era difícil de aguentar e que aquilo não era nada! Não contente com a maravilhosa actuação até então, decidi bater ruidosamente no copo com o garfo para ver se os noivos se beijavam. Alguns tiros depois (do pai da noiva), percebi que não era boa ideia.

Altamente bebida ia a noite, quando achei que era chegada a minha hora. Procurei os noivos entre cadeiras que teimavam em atravessar-se à minha frente e chegado ao destino quase impossível, renovei votos de felicidade entre promessas de uma magnífica crónica sobre o casamento deles, alvitrando as grandes hipóteses que tinham de ganhar o almejado prémio. Santo António já tinha abençoado aquele casamento de certeza… pelo menos da parte que me lembro!


P.S. - O Objectivo é descrever um casamento no méxico, recorrendo a todos os sentidos menos a visão. 10 minutos.

Bilhetado por Brunorix às 11:47

23
Out 08
Os recentes acontecimentos trouxeram a este humilde Bilhete de Ida, algum crescimento em termos de notoriedade. Por acréscimo, sinto a responsabilidade de não defraudar os eventuais passageiros desta viagem e começo a ter a preocupação de emitir bilhetes que possam também informar, para além de todas as outras coisas que espero que consigam transmitir.

Por isso, comecei a pensar o que seria interessante dizer hoje: a crise financeira actual… não, demasiado desesperante; as eleições americanas… não, sem interesse; a Manuela Ferreira Leite a dizer que não somos anões e a falar de Santana Lopes para a câmara de Lisboa… também não, muito repetitivo… Liedson a salvar o Sporting… não, what´s new?; gasolina baixou hoje na Repsol e BP… não, é de desconfiar… o que dizer então?!

Eis senão quando, surge na penumbra do meu acordar vagarosamente penoso, a notícia que interessa a todos! É que hoje, notem bem – precisamente hoje – comemoram-se os 50 anos da magnífica criação do belga Pierre "Peyo" Culliford. As simpáticas criaturas azuis que vivem em casas de cogumelos, os SCHTROUMPF! Também conhecidos em Portugal por Estrunfes, ou em Espanha por Pitufos (argh!), ou em Inglaterra por Smurfs, ou na Alemanha por Schlümpfe, ou na Polónia por Smerfach, ou na Noruega por Smuerfene ou em todo o mundo de outra maneira qualquer!



Existem Estrunfes para todas as emoções, sensações e situações. A condição humana é representada de diferentes formas em cada um destes gnomos. Qual será o Estrunfe que representa, por exemplo, as constantes candidaturas de Santana a tudo e mais alguma coisa?

Mas o que interessa é que fazem hoje 50 anos e por isso, PARABÉNS aos Estrunfes que fazem parte do imaginário de todos e de cada um e que continuam a cumprir o seu papel único no universo da BD. Há dias em que acontecem coisas importantes para o mundo, não há?!




P.S. – Este é o meu preferido!

Para que nós, leitores do Clube, nos possamos habituar à periodicidade das notícias sobre o mesmo (parece ser consensual a semanal), vou relembrando a sua existência e fazendo pontos de situação.

Assim, temos, até agora e em claro destaque, uma manifesta vontade de ler ou reler e comentar o Hotel Memória do João Tordo. Parece ser consensual a escolha desta obra para arranque das actividades do Clube. Talvez pela juventude do autor, pelo facto de não ser um livro muito grande e pelas vantagens que acarreta o facto de não se iniciar esta experiência literária-ó-virtual com uma obra muito “pesada”. Os livros não escolhidos podem sempre ser lidos depois, se assim for o desejo de todos nós. Não há barreiras, nem limites, nem regras rígidas. Aqui só impera a vontade!




Podem votar, ainda, até ao dia 1 de Novembro. Depois disso, marcarei o início da leitura, os prazos e as datas para os comentários, que se esperam muitos e bons!

Até lá, vamos lendo e votando!
Bilhetado por Brunorix às 11:01

22
Out 08
- Três canetas, duas das quais estragadas
- Uma usada edição de poemas de Fernando Pessoa
- Uma velha fotografia de um homem em uniforme

Resultado:

Experimentei uma, depois outra e só a terceira escrevia. Sempre gostei de escrever a preto. Por isso, com a minha sorte habitual só a azul o fazia. Eram bics laranja de ponta fina, que contrastavam com a mais comum bic cristal de escrita normal! Sorri a lembrar-me do anúncio…

Apesar de não ter tampa, a bic laranja de escrita fina – azul -, continuava a fazer as minhas delícias quando deslizava sobre um qualquer papel imaculado.

Larguei os gatafunhos experimentais e peguei numa edição usada de poemas de Fernando Pessoa. De tão lido que foi, era quase impossível mantê-lo fechado. Algumas páginas tinham o canto dobrado. Desrespeito pelo autor, pensei. Por muito que se goste de um poema.

“Raia-lhe a farda o sangue…” as palavras surgiram na minha cabeça, quando vi entre duas páginas uma foto de um imponente militar. Uma casaca de fazenda cheia de bordados dourados mostrava uns ombros geometricamente direitos, num orgulho altivo. O monóculo no olho direito indicava pose de chefia poética. As muitas manchas da velha fotografia, não deixavam transparecer na totalidade a idade do fotografado, mas os galões indicavam uma idade condigna com a patente.

Voltei a colocar a foto dentro do livro e continuei a caminhada naquele labirinto de vida, remexendo gavetas de passado e perscrutando paredes de história. No entanto, conforme mudava de sala, constatava atónito que estavam todas vazias. Como seria possível sentir toda aquela carga de memória apenas com 3 canetas, um livro de poemas e uma foto?!

O pé-direito alto das divisões, o papel de parede antigo e o cheiro a século XIX, intrigavam-me do pensamento a conclusão. Sentia cultura à minha volta e amor pelas palavras. Ali tinha vivido de certeza um escritor! Preferia o preto para escrever, lia Fernando Pessoa… Um impulso literário continuava a empurrar-me na direcção dessa conclusão. Encostei o ouvido a uma parede e ouvi grandes nomes a recitar as suas obras. Estou numa casa de cultura, pensei.



Embora não perceba bem porquê, sinto que invejo quem ali habitou. Uma sintonia entre os meus gostos e vontades parecia enquadrar-se naquele ambiente. Sento-me no chão e tento, da já imparável curiosidade, tentar descortinar mais sobre o quem e o como, na expectativa de absorver inspiração.

Continuo a deixar transpirar nas minhas mãos a sensibilidade daqueles objectos. O uso intensivo da escrita ou do desenho, a cultura implícita e adorada naquele livro, a forte ligação à família na pele de uma velha foto com uma dedicatória a um filho comovido de a receber, a conjugação de todos e a sua importância isolada, faziam daquela feliz reunião a certeza de alguém muito especial. Pesei actos consumados e cheirei constatações. Deixei que falassem comigo, da mesma maneira que falaram com o seu antigo dono.

Levantei-me. Deixei aquela casa para nunca lá mais voltar, satisfeito com a vida que descobrira e que sentia agora ser minha também!
Bilhetado por Brunorix às 13:21

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